Parcerias Público-Privadas

17 de abril de 2017

Otimista que sou, sei que uma crise econômica pode trazer muitos pontos positivos. Entre eles, a exigência que o momento impõe aos administradores, sejam públicos ou CEO’s de empresas privadas, de buscarem pela maior eficiência possível na gestão o que, em outras palavras, significa fazer mais com menos. Isso não implica somente em inovar, mas eventualmente utilizar mecanismos já existentes e que haviam sido deixados de lado nos tempos de bonança. É o caso das famosas Parcerias Público-Privadas (Lei n. 11.079/2004), renovadas com o advento  do chamado PPI (Programa de Parceira de Investimentos – Lei n. 13.334/2016).

 

Olhando para nosso passado recente, enxergamos um período de razoável prosperidade, que o estado poderia ter aproveitado para ampliar o caixa e se preparar para os tempos de “vacas magras”. Fazer caixa no momento de bonança e gastar na crise é o melhor remédio, segundo Alan Greenspan no seu livro “A era da turbulência”. Mas o Estado brasileiro não o fez e acabou por assumir sozinho um grande número de obras, desde estádios e  sinas a portos e rodovias. Para ser justo, convém lembrar que foram feitas algumas concessões e poucas parcerias público-privadas.

 

O gasto foi enorme e os tais tempos de “vacas magras” chegaram (sempre chegam),  mas as necessidades brasileiras, que já eram altas, aumentaram.

 

Diminuir o risco não significa que o parceiro Público (União, Estado ou Município) arcará com todo e qualquer prejuízo, até porque a legislação estabelece a obrigação de “repartição de riscos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária”. O esclarecimento é relevante diante das evidências de uma relação espúria entre o público e o privado no Brasil. Com as vísceras da corrupção à mostra, não custa relembrar que parceria implica em riscos mútuos.

 

As restrições da lei n. 11.079/2004, que instituiu as PPP’s na legislação brasileira, são claras. O contrato mínimo de R$ 20 milhões e a vedação às concessões comuns, as permissões de serviços públicos e os arrendamentos de bens públicos são bons exemplos. Apesar disso, a legislação já trazia algumas ideias importantes e que poderiam ter gerado mais benefícios. Aqui faço um parêntesis para dizer que há pelo Brasil um razoável número de Parceria Público-Privadas, muitas delas em pleno funcionamento e com sucesso. Caso do chamado “Porto Maravilha”, no Rio de Janeiro.

 

O que era bom ficou ainda melhor com a chegada da Lei n. 13.334/2016. Ela ampliou as possibilidades de PPP’s, agregando a possibilidade das concessões comuns, das permissões de serviços públicos, do arrendamento de bens públicos, entre outros. Com isso, e o período de arrecadação mais baixa devido

à crise, saltaram oportunidades a gestores púbicos e a empresas privadas. Eis que a solução passou a ser transferir, para a iniciativa privada, o investimento em alguns serviços públicos (hospitais, por exemplo) que, em tese, ganhariam mais qualidade com menos gastos para o erário.

 

Algumas coisas precisam ser ditas antes que todo o gestor grite aos quatro cantos que fará parcerias público- -privadas em todos os setores do governo.

Calma lá. Como dito no início, o que se exige, antes de tudo, é melhoria na gestão, o que demanda mais atenção no modo de gerir a res pública.

O “calma lá” se justifica porque, conforme art. 10 da legislação das PPP’s, a parceria deve ser precedida de uma licitação na modalidade de Concorrência e de um estudo técnico que demonstre a

viabilidade do projeto. É preciso considerar também a conveniência e a oportunidade da contratação; se as despesas criadas ou aumentadas não afetarão as metas de resultados fiscais; a estimativa

do impacto orçamentário-financeiro nos exercícios em que deva vigorar o contrato de parceria público-privada (o prazo pode ser chegar a 35 anos); a declaração do ordenador da despesa de que as obrigações contraídas pela Administração Pública no decorrer do contrato são compatíveis com a lei de diretrizes orçamentárias e estão previstas na lei orçamentária anual (atenção, gestor!); a submissão da minuta de edital e de contrato

à consulta pública mediante publicação na imprensa oficial, em jornais de grande circulação e por meio eletrônico; a informação da justificativa para a contratação, da identificação do objeto, do prazo de duração do contrato, seu valor estimado; dentre outras exigências.

 

Salta aos olhos a imensa responsabilidade  que o gestor público continua  a ter. Observa-se, inclusive, que a Lei de Responsabilidade Fiscal continua firme e forte, regendo esse tipo de relação. Significa dizer que, por exemplo, tem que haver uma “declaração do ordenador da  despesa de que as obrigações contraídas pela Administração Pública no decorrer do contrato são compatíveis com a lei de diretrizes orçamentárias e estão previstas na lei orçamentária anual”, segundo art. 10, III, da Lei n. 11.079, ou, ainda, que “seu objeto estar previsto no plano plurianual em vigor no âmbito onde o contrato será celebrado”, de acordo com o art. 10, V, da lei de PPP. Mais que isso! O poder público deve viabilizar garantias adicionais ao parceiro privado e algumas atividades não são delegáveis. Segurança pública, por exemplo, com exceção para presídios.

 

São exigências que não devem ser menosprezadas, pois algumas implicam em previsão e estimativa de fluxo e impacto orçamentário por toda a vigência do contrato. Uma demonstração da importância de uma modelagem financeira precisa e bem fundamentada, além de um modo de governar mais atento ao  orçamento e seguro nas previsões.

Há ainda a necessidade de avaliação constante de performance. Ou seja, não basta fazer a parceria. A fiscalização deve ser permanente, pois a finalidade é o interesse público, junto com a boa prestação de serviço ao usuário e o maior e melhor resultado com menos gasto. O bônus é a geração de emprego.

 

A iniciativa privada precisa atentar para todas essas observações e também para o fato de que a lei estabelece que a Sociedade de Propósito Específico formada para a parceria “deverá obedecer a padrões de governança corporativa e adotar contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas”. O que torna necessária a implantação de um rigoroso programa de Compliance dentro da empresa.

 

Estabelecer parcerias entre entes públicos e privados é, claramente, uma boa solução para os problemas de má prestação de serviços públicos e gargalos que travam o desenvolvimento mais rápido do país. Mas não é tarefa simples e exige de ambos os lados preocupação com o bem comum e capacidade gerencial acima da média.

 

O que se espera é que a crise traga ações positivas que impactem a prestação de serviços públicos, reduzam gargalos na infraestrutura e diminuam gastos públicos, promovendo interação entre governos e iniciativa privada. Para os dois setores, há oportunidades de investimento e lucro.

 

A solução já foi adotada por outros países. Aqui, precisa de mais atenção e entendimento. Todos podem ganhar com a iniciativa.

 

Dr. Marcos Vinicus Boschirolli, é Advogado OAB PR 19.647, Sócio da banca Boschirolli, Gallio & Oliveira – OAB PR 1.541.